Desde a última quinta-feira (7/8), as relações diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos atravessam um momento de tensão.
O atrito começou após a Embaixada norte-americana em Brasília publicar, nas redes sociais, uma advertência direta ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e a pessoas próximas a ele.

No comunicado, divulgado no perfil oficial da embaixada no X (antigo Twitter) na quinta-feira (7/8), Moraes foi descrito como "o principal arquiteto da censura e perseguição contra (Jair) Bolsonaro e seus apoiadores". O texto acusava o magistrado de cometer "flagrantes violações de direitos humanos" — motivo, segundo Washington, para que o governo de Donald Trump aplicasse sanções contra ele com base na Lei Global Magnitsky.
A mensagem também advertia que integrantes do Judiciário e de outros setores "estão avisados para não apoiar nem facilitar" as ações do ministro, ressaltando que o governo americano "monitora a situação de perto".
Diante da repercussão, o Itamaraty convocou, já na sexta-feira (8/8), o encarregado de negócios da Embaixada dos EUA no Brasil, Gabriel Escobar, para uma reunião na sede do Ministério das Relações Exteriores, em Brasília.
Escobar é o diplomata de mais alto escalão da representação norte-americana no país desde que Trump reassumiu a presidência e ainda não nomeou um embaixador para o posto. A embaixada confirmou o encontro, mas afirmou que não divulga o conteúdo de reuniões privadas.
A crise se aprofundou no sábado (9/8), quando o vice-secretário do Departamento de Estado dos EUA, Christopher Landau, publicou no X — em mensagem posteriormente republicada pela embaixada americana — novas críticas a Moraes.

Landau acusou o ministro de exercer um "poder ditatorial" e de ter "destruído a relação histórica de proximidade entre Brasil e Estados Unidos". Ele também declarou que Washington pretende "restaurar a amizade histórica com a grande nação do Brasil".
A resposta do governo brasileiro veio na sequência.
Em nota, o Palácio do Planalto afirmou que as declarações configuram "um ataque frontal à soberania" e acusou os EUA de "reiteradas ingerências" em assuntos internos.
"O Governo brasileiro manifestou ontem à embaixada dos Estados Unidos seu absoluto rechaço (…) e voltará a fazê-lo sempre que for atacado com falsidades como as da postagem de hoje", dizia o texto, mencionando que o país "recentemente derrotou uma tentativa de golpe de Estado e não se curvará a pressões, venham de onde vierem".
O STF não se pronunciou oficialmente sobre o caso.
Já Gleisi Hoffmann, ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, classificou a publicação como "gravíssima ofensa ao Brasil, ao STF e à verdade" e disse que o tom da mensagem foi "arrogante".
O episódio marca um dos momentos mais duros no relacionamento bilateral desde o retorno de Trump à Casa Branca, com trocas públicas de acusações e gestos diplomáticos raros, como a convocação de um alto representante estrangeiro pelo governo brasileiro.
A carta de Trump e a escalada da crise
Uma carta enviada por Donald Trump ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 9 de julho destoou das dezenas de mensagens que o líder norte-americano encaminhou a outros chefes de Estado e publicou em suas redes sociais.
No texto, Trump anunciou tarifas adicionais de 50% sobre qualquer produto brasileiro exportado aos Estados Unidos e justificou a medida com argumentos de cunho político — citando o tratamento dado pelo Judiciário ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e a empresas de tecnologia dos EUA. Esse tipo de justificativa não apareceu nas cartas divulgadas nos últimos dias para outros países.
Enquanto as mensagens encaminhadas a outros governantes apresentavam redação idêntica entre si e um tom bem mais cordial, a enviada a Lula adotou uma abordagem mais dura.
Em entrevistas concedidas logo depois, Lula afirmou que "não pode admitir" a "ingerência de um país na soberania de outro" e criticou "a intromissão de um presidente de um país no Poder Judiciário do meu país".
Poucos dias depois, Trump anunciou a abertura de uma investigação sobre o que classificou como práticas comerciais "desleais" do Brasil, indicando que áreas específicas, como os serviços de pagamento eletrônico, estariam na mira.
Embora o Pix não tenha sido mencionado nominalmente pela Casa Branca, o governo americano acusou o Brasil de favorecer "serviços de pagamento eletrônico desenvolvidos pelo governo".
Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cvgvvr4ne7do